viernes. 26.04.2024

“De volta às plantas” parte de um convite das Comédias do Minho à coreógrafa Filipa Francisco para desenvolver uma criação nos seus territórios, com as comunidades locais, tendo como tema o próprio lugar. 

O espetáculo acontece em percurso. Caminha-se, fala-se da ideia de caminhar na paisagem. Através das plantas, e da sua existência desde o início do mundo como o conhecemos hoje, contam-se histórias que geram danças e celebrações. O público é envolvido sensorialmente e propõe-se que dê atenção à paisagem e às plantas que o rodeiam.

O processo de criação começou com o livro “A vida das plantas. Uma metafísica da mistura”, do filósofo e professor Emanuele Coccia. Este ensaio é uma tentativa do autor de ressuscitar as ideias nascidas em cinco anos de contemplação da natureza, do seu silêncio, da sua aparente indiferença a tudo o que chamamos cultura. Dele, Filipa Francisco retira as bases para formular perguntas aos seus intérpretes profissionais e não profissionais, neste regresso à natureza, à terra-mãe onde colocamos os pés e que nos envolve através dos cinco sentidos.

Plantas autóctones, existentes ou que se encontram em vias de desaparecimento, são ativadoras deste processo que envolve saberes e conhecimentos de diferentes gerações, de grupos sociais diversos.

Em Vila Nova de Cerveira e em Melgaço, o espetáculo conta com dois grupos de cocriadores e de pessoas dos respetivos municípios. Apesar de terem partido de premissas comuns para a sua criação, os espetáculos são diferentes. Ambos mantêm o foco nos espaços naturais e na forma como são ocupados pelo Homem. Em Vila Nova de Cerveira privilegia-se a palavra e o canto. Conduzidos por Rui Mendonça, Pedro Santos, Sílvia Pinto Ferreira e intérpretes da comunidade cerveirense, os espectadores caminham numa paisagem onde os sons do Rio Minho se impõem. Em Melgaço, numa paisagem que sofreu menos intervenção humana, o espetáculo é mais abstrato e sensorial. Os espectadores são conduzidos por Cheila Pereira, Mariana Tengner Barros, Tiago Candal e intérpretes da comunidade melgacense.   

À pergunta "O que acha deste trabalho e como está a ser esta experiência?", Maria do Amparo Tábuas, uma das intérpretes não profissionais de Melgaço, responde:

"Tenho 70 anos e nunca tinha feito de planta - colocar no corpo um outro, ser um outro, colocar-me no lugar do outro." 

Hugo Cruz, que esteve envolvido no início deste processo de criação, escreveu « “De volta às plantas” pretende colocar em conexão o humano com o não humano, sublinhando a ideia de que o humano tem que se adaptar à restante natureza e não necessariamente o contrário – como o progresso e a modernidade impõem. O presente revela que essa relação colonizadora do ser humano perante a natureza, de que faz parte, está esgotada, sendo que o local, sem perder a ligação ao global e ao universal, inspira outros contornos para modos de pensar e fazer.” »

A visão sobre o futuro depende também da forma como se olha para o passado. Magda Henriques, diretora artística das Comédias do Minho, adianta que “as Comédias do Minho devem a sua origem à cooperação entre cinco municípios e devem a sua existência, desde 2003, aos laços criados entre as pessoas dessas comunidades. Com o espetáculo “De volta às plantas”de Filipa Francisco, são também essas ligações de confiança que queremos celebrar. Mergulhamos no lugar para tratar de um assunto urgente e simultaneamente ancestral – a nossa relação com os outros elementos da natureza. Tomamos o mundo das plantas como metáfora. É na invisibilidade das ligações de cooperação que grande parte deste mundo acontece.” 

De volta às plantas
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